Amigos anguerenses,
confesso que resistir muito para escrever este texto. Tal resistência se deu
por acreditar que agradaria a uns e a outros não. Mas, como eu ainda não vi e
nem conheço alguém que conseguiu agradar a todos, então, permitam-me adentrar
na discussão e emitir a minha opinião no meio a contenda promovida por comerciantes,
comerciários e consumidores sobre o referido tema. Esses, com a nova regra, que
tanto os incomodou, não resistindo à desaceleração das vendas, procuraram o
poder público local para resgatar o funcionamento do comércio nos dias de
domingo e, consequentemente, alavancar as vendas para recuperar o tempo perdido.
Não me interessa aqui
analisar os vieses positivo e negativo da nova lei, pois, já o fiz quando a
direção deste blog publicou o texto: Uma
breve análise econômica, social e jurídica da lei que estabelece o horário de
funcionamento do comércio de Anguera. O objeto desse ensaio teórico é informar
aos destinatários da norma que o objetivo protetivo ao trabalhador da nova lei
e o acordo realizado entre os detentores do capital e administração pública,
não possuem respaldo legal e confrontam com os regramentos do devido processo
legislativo. É o que passo a informar.
Venho acompanhando as
notícias sobre a aflição dos comerciantes pelas perdas financeiras decorrentes
da lei municipal: redução das vendas e diminuição dos lucros.
Concomitantemente, por parte dos comerciários, percebi a preocupação com a perda
do direito ao descanso semanal, como se verificava antes da promulgação da lei.
Bem como a insatisfação dos consumidores com o fechamento do comércio aos
domingos.
Nesse interim, com
vistas a solucionar a celeuma instalada entre consumidores, comerciantes e
comerciários; a administração pública municipal, através de um “acordo”,
suspendeu a eficácia da norma que vedava o funcionamento do comércio local aos
domingos, fazendo constar no bojo da convenção o comprometimento dos
comerciantes em honrar com os encargos sociais de seus funcionários.
A primeira vista, na
visão do homem médio, o “acordo” parecia uma solução perfeita ao atender a
todos os interesses conflitantes. Entretanto, juridicamente pensando, se verá
que há vícios formais e materiais que maculam a existência e a validade do que
se pode chamar ato administrativo.
Ou seja, a lei
municipal que estabeleceu a vedação, constitui lei ordinária municipal,
promulgada segundo regular processo legislativo. Como está explícito em nosso
ordenamento jurídico, somente lei pode revogar ou modificar outra lei. Logo, o “acordo”,
ato administrativo, não constitui fonte normativa capaz de modificar a previsão
legal e legítima para autorizar o que uma lei proíbe. As leis existem para serem
cumpridas, e seu império atinge a todos, inclusive a administração pública
(princípio da legalidade), cuja atuação está adstrita ao que promana a lei, não
tendo ela poder de derrogar e alterar uma regra para atender a interesse
próprio ou de parte da população.
Ademais, quanto à
preocupação esposada pelos comerciários de que a lei municipal foi benéfica ao
proibir o funcionamento comercial aos domingos, é importante informar que essa
proteção sempre existiu, mas não era cumprida pelos comerciantes, como se
verifica dos dispositivos seguintes: incisos XIII, XIV, XV e XVI do artigo 7º
da Constituição Federal; os artigos 58, 66, 67 e 68 e seguintes da Consolidação
das Leis do Trabalho; a Lei Nº 605/49.
Então, queridos
leitores, a conclusão a que se chega é o errôneo entendimento da norma e a
ingerência ilegal da administração pública no processo legislativo.
Sendo assim, para
solucionar a contenda, deveria o poder público municipal ou os interessados (5%
do eleitorado local), através de projeto de lei ordinária municipal, propor
alteração da lei, revogando a disposição nela constante e autorizando o
funcionamento do comércio aos domingos. O que o ordenamento jurídico não
permite é a vigência simultânea e contraditória de lei e ato normativo
municipal posterior e a existência de um ato administrativo revogador de
disposição legal.
Apesar de todos os
vícios e irregularidades legais, administrativas e de entendimento; deve-se
reconhecer a vontade da administração pública em atender a um clamor social,
com vistas ao bem estar de todos e na defesa do crescimento econômico
municipal. Contudo tais irregularidades devem ser sanadas, em nome do respeito à
estrita legalidade e ao princípio da divisão dos poderes. Bem como para que não
sirva de entraves ao funcionamento de um comércio pujante como o da cidade de
Anguera.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
ATENÇÃO! NÃO SERÃO PERMITIDOS E ACEITOS OS COMENTÁRIOS QUE VIEREM COM OFENSAS E XINGAMENTOS.
AO POSTAR O COMENTÁRIO ESCOLHA A OPÇÃO: Nome/URL e comente usando o seu nome.